Dizem
que o Natal é tudo menos tempo para trabalhar. Talvez tenham razão. Mas
aplicar-se-à a todo o trabalho? Se o Natal é o cabaz daquelas coisas belas e
virtuosas que perfazem o célebre “espírito natalício”, porque há o trabalho de
profanar o feriado se, em vez, ajudar a reforçar o conjunto?
Há
trabalhos que mereciam um louvor público por não pararem neste dia. Um exemplo:
o único café que hoje trabalhou na zona onde moro esteve carregado de famílias
bem dispostas, algumas mesas completas por membros de três gerações sentadas e
apertadas, bebericando o café para atenuar a fartura do almoço. Os empregados
atenderam-nas como se tratasse da sua missão mais nobre. E era, de facto.
E
como no dia 25, também na véspera. Ontem em Braga, a Brasileira (a mais genuína
das Brasileiras portuguesas) encheu as suas várias salas com mesas de famílias,
amigos e conhecidos. Três dos nossos confrades lá se encontraram para o bem
afamado cafézinho de saco antes de se lançarem nos rituais ultra pagãos do
moscatel à chuva. E fomos atendidos como se não fosse véspera de Natal, mas
como se fosse um simples dia de sol noutra estação qualquer. E por isso o café
soube deliciosamente a Natal – como, de resto, é lá costume durante todo o
ano.
Um
café aberto traz tanto calor a este dia como uma mesa bem composta em cada
casa. Se uma família se reúne no conforto da sala de jantar para
trocar mimos e lembranças enquanto vão passando as travessas do almoço, não há
lugar a conversa tão franca e tão solta como à volta da mesa do café. E isto
hoje em dia é um gosto cada vez mais raro.
Nesta
ocasião já não fui a tempo, mas para o ano, pela parte que me toca, farei por
ter a porta da minha casa de vinhos aberta neste dia. E tal como os senhores do
Moreira, da Rainha e da Brasileira (os meus cafés neste Natal) tentarei
desempenhar tão bem quanto puder – quanto eles – esta valerosa missão. Senão em
torno do café, então do copo de Porto.
publicado em 25.12.2012