Les feuilles mortes



Hoje fui almoçar à Subway aqui à beira do escritório e veio-se sentar à minha mesa um velho que trazia na mão uma cookie de amendoim.
Do you speak French? ‘Cause you look French. Não, desculpe, só percebo algumas palavras soltas. Sou português. Porquê a pergunta? Well, usually when I see people that look French I come and talk with them. You see, there’s a song that I like; it’s called“Autumn Leaves”, from Nat King Cole. You know it? Já a ouvi, sim. It’s my favorite song. Or it was my favorite song, ’till I heard the original, in French. Ah, sim, “Les feuilles mortes”. Yeah, you know it! However, the meaning of the song isn’t the same: in French the song isn’t about leaves at all; it’s about love! Hum, pois – e dou outra trinca na sandes. What I want to ask you is if you can tell me the meaning of the French lyrics. Here, I’ll sing it for you.
Então pousou a cookie e começou a cantar, com o mesmo tom grave do King. Os chineses não se safam com línguas latinas (já o Inglês é um ver-se-te-avias), mas este Maurice Chevalier de Hong Kong, graduado em dicção francesa pelo Youtube, nem se safava mal. Ia percebendo partes de versos, ou versos inteiros, ou verso nenhum, e lá lhe fui traduzindo a letra.
C’est une chanson qui nous ressemble.
Toi, tu m’aimais et je t’aimais
Et nous vivions tous deux ensemble,
Toi qui m’aimais, moi qui t’aimais.
Mais la vie sépare ceux qui s’aiment,
Tout doucement, sans faire de bruit
Et la mer efface sur le sable
Les pas des amants désunis.
David Lo trabalhou para a televisão de Hong Kong como cantor, já lá vão muitos anos. A fama breve levou-o a viajar pelo mundo fora. Durante algum tempo teve o seu próprio espectáculo em Las Vegas interpretando (leia-se, imitando) os clássicos para grupos de turistas chineses: o Sinatra, o King, o Martin (e lá começa a cantarolar uma enamorada), e ocasionalmente as músicas do seu autor preferido, Johnny Mandel. Passou por França e apaixonou-se pela música e pelos seus cantores. Agora, reformado, maravilha-se com as potencialidades do Youtube.
Acabei a sandes, trocamos mais algumas impressões sobre cantores de jazz americanos echansons francesas, dei-lhe um bacalhau como há muito tempo já não dava, e vim-me embora.
Nunca me senti próximo dos maluquinhos da rua como em Hong Kong. Pena haver tão poucos. Ah, é verdade: a boina e o bigode estão de volta. 
À tua, David!


publicado em 22.03.2011